As conturbadas e lamentáveis cenas e declarações protagonizadas pelos políticos brasileiros, na última semana, após o anúncio do novo valor do piso nacional do magistério pelo MEC (R$ 1.451,00) - o qual difere da quantia defendida pela CNTE (R$ 1.937,26) - expõe, como dissemos no editorial anterior, as fragilidades do federalismo nacional e requer, imediatamente, ações do Estado no sentido de garantir o cumprimento da legislação e de viabilizar, em definitivo, uma política pública essencial para a qualidade da educação escolar.
O primeiro consenso a ser construído refere-se à vontade política dos entes federados (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) em valorizar o magistério e os demais educadores. Partindo desse compromisso, é preciso enfrentar os problemas com vistas a construir um pacto pela educação, ao longo da próxima década.
Transposto o compromisso político, que se pauta na vinculação necessária do piso ao Fundo da Educação Básica - Fundeb, principal fonte pagadora dos vencimentos de carreira do magistério, e à meta 17 do novo Plano Nacional de Educação, cujo objetivo consiste em equiparar a remuneração média dos docentes à de outras categoriais até o final da década, entram em cena as questões práticas a serem adotadas por cada Executivo da federação e pelos poderes Legislativo e Judiciário.
Em âmbito estadual e municipal, governadores e prefeitos devem assegurar a gestão financeira dos recursos vinculados à educação ao responsável direto das respectivas secretarias, à luz do art. 69, § 5º da Lei 9.394/96 (LDB). O funcionamento e a autonomia dos conselhos sociais de acompanhamento do Fundeb devem ser respeitados, a fim de auxiliar na fiscalização da gestão pública educacional.
É preciso, assim, transparência das administrações em relação aos tributos arrecadados e aos gastos efetuados com a educação, para que o auxílio federal, se necessário, ocorra em bases republicanas, sem prejuízo aos entes que cumprem rigorosamente com os princípios da administração pública e com os preceitos legais da educação.
Na esfera federal, o MEC, como indutor das políticas nacionais, precisa ter acesso seguro às informações de estados, municípios e do DF (aperfeiçoando o SIOPE - Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação), bem como estipular, em parceria com a Secretaria do Tesouro Nacional e com os órgão equivalentes dos Estados e Municípios, mecanismos para medir a capacidade contributiva dos entes federativos, como forma de condicionar as possíveis complementações da União ao cumprimento das metas de esforço fiscal de cada um deles. A previsão dessa iniciativa encontra-se esculpida no art. 75, § 1º da LDB.
Ao Congresso Nacional compete regulamentar a estrutura cooperativa da educação entre os entes federados, preferencialmente através da regulamentação do art. 23 da Constituição, que também deve prever espécie de intervenção federal nas hipóteses de as administrações deixarem de cumprir com seus deveres legais e constitucionais. É preciso, ainda, em consonância com o Plano Nacional de Educação, garantir mais recursos para a educação - ao menos 10% do PIB, durante a próxima década -, o que deverá ocorrer tanto pela realocação ou majoração dos recursos vinculados, como pela destinação de parcela oriunda das riquezas do pré-sal (no mínimo 50%) e maior participação da União no financiamento da educação básica (dos 5,2% do PIB investidos atualmente na educação, a parcela da União, detentora de maior parte do bolo tributário, corresponde a pouco mais de 1%).
Outras duas questões que envolvem o Parlamento dizem respeito à alteração da Lei 11.494 (Fundeb), no tocante à barreira imposta para a complementação do Governo Federal ao piso do magistério - hoje, apenas estados e municípios contemplados com a suplementação da União ao Fundeb podem acessar os recursos destinados à remuneração docente -, e à aprovação da Lei de Responsabilidade Educacional, cujo conteúdo deve primar pelo correto investimento das verbas educacionais e pela punição à malversação do dinheiro público e o desleixo do gestor com as metas do PNE.
Com relação ao Judiciário, três questões são chaves: i) a superação do impasse interpretativo dos comandos do art. 212 da Constituição e art. 60 do ADCT/CF com a Lei de Responsabilidade Fiscal, a fim de assegurar o investimento integral dos recursos vinculados à educação, inclusive com a folha de pessoal; ii) a execução de controle externo sobre as ações dos Tribunais de Contas de Estados e Municípios (onde houver esse último); e iii) a celeridade na punição de gestores que desviam recursos públicos e cometem outras ilegalidades.
A partir da próxima semana o Congresso Nacional deve iniciar o debate sobre a alteração do índice de reajuste do piso salarial do magistério, e os trabalhadores não abrirão mão da perspectiva de valorização real do Piso - pois “teoria furada” é o reajuste de piso pela inflação, como propôs o governador Tarso Genro, colidindo com o avanço social obtido no governo Lula de ganho real ao salário mínimo (o piso geral dos brasileiros).
Porém, para que a pauta da valorização dos/as educadores/as avance no Congresso e se efetive nas administrações públicas, será necessário colocar na mesa de negociação, além das questões tratadas acima, a necessidade de se estabelecer um parâmetro mínimo para as carreiras do magistério público escolar em todo país, como forma de dimensionar (com justiça e equidade) a parcela de suplementação da União para a garantia do padrão mínimo de qualidade educacional e, consequentemente, para o piso e a carreira do magistério.
Os desafios são muitos, além de complexos, o que comprova a necessidade do país em avançar, juntamente com o debate do Piso, do PNE, do Custo Aluno Qualidade e de outras políticas públicas, na construção imediata do Sistema Nacional de Educação.
CNTE
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