Cátia Chagas/Da redação
Goiás - Na próxima quarta-feira será votado o polêmico projeto de lei que prevê a castração química para apenados condenados por crime de pedofilia e abuso sexual, do senador Gerson Camata (PMDB-ES). Caso seja aprovada pelos membros da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, a proposta será enviada diretamente à Câmara dos Deputados, pois é de caráter terminativo. O projeto permite ao preso optar pela aplicação do procedimento. Os que se submeterem ao tratamento poderão ter redução de até 1/3 da pena, caso iniciem a terapia antes de ser concedida a liberdade condicional.
De acordo com o coordenador-geral da Comissão dos Direitos Humanos da OAB/RS, Ricardo Breier, o tema deveria passar por um debate mais amplo. Mesmo assim, ele defende a aprovação da proposta em vista do trabalho feito pela CPI da Pedofilia e da maneira como o autor do projeto vem conduzindo a matéria. "Seria uma medida de caráter preventivo", assegura. Conforme Breier, "o Estado deve proporcionar o melhor método para os indivíduos que cometem esse crime e só prisão não resolve".
Para ele, que diz defender tanto o direito dos presos quanto o das vítimas, a castração química, ao contrário das críticas, não é uma pena. "Eu considero um tratamento assim como outras terapias", afirma. Breier defende o método porque enquanto tratamento, evitaria novas vítimas. "Tem que haver um equilíbrio dos direitos fundamentais, pensar no preso, mas pensar na vítima também", frisa.
"OUTRO PAÍS"
Na visão do médico urologista Cezar Padoin, a ideia parece ser "uma coisa boa, mas inexequível no Brasil". Ele levanta uma questão: se o Estado não consegue manter a pessoa presa, como poderá fazê-la tomar uma injeção a cada três meses? "Não vejo como o Estado vai forçar o indivíduo a isso", observa o médico ao salientar que cada dose custa R$ 1,5 mil. "Seria um desperdício. Os senadores vivem em outro país, nossos políticos não sabem em que país vivem", indigna-se.
A injeção para castração química – que bloqueia a produção de testosterona, o hormônio masculino, pelo organismo – é um método antigo. Segundo Padoin, já é aplicado em outros países para diminuir a libido e a agressividade. Tem alguns efeitos colaterais, como o ganho de peso e uma tendência a desenvolver osteoporose. "Por isso querem que o apenado opte", explica Padoin.
O médico acredita que a lei até possa ser aprovada, mas dificilmente vai entrar em vigor por conta das dificuldades que sua aplicação irá impor. Ele também questiona os reais motivos do projeto. "É uma brecha para aliviar os presídios", opina. Pessoalmente, Padoin é a favor da medida, mas contra a redução de pena, que é o que prevê o projeto de lei.
Método é considerado punição cruel
Embora seja cada vez mais defendida nos círculos médicos, a terapia também recebe críticas. O American Civil Liberties Union, uma organização norte-americana que luta pelos direitos individuais, alega que dar a um preso substâncias químicas que controlem seu comportamento é uma "punição cruel e incomum". O grupo ainda atenta aos efeitos colaterais dessas substâncias, como aumento de peso, fadiga e trombose, entre outros.
A OAB de São Paulo também se posicionou contra a proposta. Na semana passada, o presidente da instituição, Luiz Flávio Borges D’Urso, classificou como "inconstitucional" o projeto de lei. De acordo com o advogado, o projeto implica "condições de crueldade". "O Estado não tem sentimentos, tem de ser isento para aplicar a pena", criticou. "O projeto de castração afronta a Constituição", completou.
Procurado pela reportagem, o Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers), segundo a assessoria, alegou que, se houver manifestação oficial sobre o assunto, esta virá do Conselho Federal de Medicina (CFM). O CFM, conforme sua assessoria, ainda não deu indícios de que vá se posicionar sobre o tema.
A castração química já é adotada nos Estados Unidos e Canadá. Ela reduz a libido de condenados por meio de medicamentos que agem no controle hormonal. Diferentemente de outros países que adotaram a obrigatoriedade do tratamento em casos graves de pedofilia, no Brasil o condenado poderá optar pelo tratamento e ter redução de pena.
Sobre a droga
A droga mais usada no tratamento é a Depo-Provera, que reduz os níveis de testosterona. O curioso é que a polêmica sobre validade da proposta não se restringe apenas ao campo de direitos individuais. Há dúvidas sobre como tornar a aplicação do tratamento uma solução definitiva.
Não há muitas discussões em torno do poder de eficácia. O psiquiatra e professor da Faculdade de Medicina da PUC-SP, Antônio Matos Fontana, avalia que o tratamento pode de fato tornar os condenados mais disciplinados e sociáveis.
Ele estima que até 75% dos casos no exterior respondem bem ao procedimento.
Por outro lado, o próprio professor Fontana lembra que a castração química necessita de manutenção – o que também pressupõe custo das autoridades públicas. Entre três e quatro semanas após a suspensão do remédio, a libido do usuário é restabelecida ao seu nível normal. "É necessário haver um acompanhamento por parte dos médicos e da Justiça", alerta.
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