Dentro de um País em que se buscam melhorias na área de Segurança Pública está a figura do Delegado de Polícia. O Delegado de Polícia como chefe da Instituição Policial Civil. Como chefe da Polícia Judiciária a espera do reconhecimento da sua carreira Jurídica e ao mesmo tempo sendo desvirtuado das suas atribuições tendo que assumir posto diverso da sua competência, perdendo espaço através dos tempos e sofrendo interferências para perder também a presidência do seu principal ato, qual seja, o Inquérito Policial.
O Mestre BASILEU GARCIA bem definiu o que é o Delegado de Polícia junto com o Inquérito Policial: “O Delegado de Polícia é o guardião da sociedade e das Leis penais, Ele verifica, in loco, no calor dos fatos, os verdadeiros problemas sociais. Verificando uma infração penal, consubstancia pela entrega ao Judiciário dos fatos, do autor, da materialidade, dos motivos, condições e circunstâncias do delito, a fim de auxiliar na prática da Justiça. Ele é Polícia Judiciária.”
Ao mesmo tempo em que o Inquérito Policial ganhou força com a evolução das eras e maior credibilidade com o advento do computador que ajuda a produzir provas tecnológicas autorizadas pela Justiça referentes às interceptações e rastreamento de ligações telefônicas dos investigados, bem como em outros meios que intercedem para maior robustez daquele instrumento de defesa da cidadania, a Polícia Judiciária perdeu campo com a atual Constituição Federal, quando o Delegado de Polícia deixou de ter o poder de expedir o Mandado de Busca e Apreensão, ou seja, com aquela força a Investigação Policial era mais célere, mais benéfica para certas vítimas e até mesmo bem melhor para produção de maiores provas objetivando a busca da verdade real que bem dignifica o Processo Penal.
O poder do Delegado de Polícia de expedir - conforme seu entendimento - o Mandado de Busca e Apreensão de provas em residências ou noutros estabelecimentos trazia boas conseqüências às vítimas de crimes contra o patrimônio, pois quando a Polícia apreendia delinqüentes por prática daqueles crimes, de imediato, tais mandados eram expedidos e quase sempre as vítimas tinham seus bens recuperados.
Referente a questão do Termo Circunstanciado de Ocorrência que já vem sendo lavrado pela Polícia Militar em todo o Brasil, tirando essa prerrogativa que era exclusiva do Delegado de Policia, ainda é discutida em esferas Judiciais que por certo trarão decisões adequadas. Nesse sentido entende a maioria dos Juristas que a competência é do Delegado de Polícia, a exemplo do pensamento de JULIO MIRABETE quando afirmou: “Numa interpretação literal, lógica e mesmo legal, somente o Delegado de Polícia pode determinar a lavratura do Termo Circunstanciado”. Esse mesmo pensamento é seguido também pela moderna doutrina penalista, a exemplo de nomes como Rômulo de Andrade Moreira, Guilherme de Souza Nucci, Cezar Roberto Bittencourt, dentre outros. Observa-se, entretanto, que a partir dessa suposta “conquista” por parte da Policia Militar, eles já estão querendo até presidir o Inquérito Policial comum, o que não deixa de ser um total contra- senso, vez que tal pretensão esbarra-se nos Preceitos Constitucionais referentes às atribuições das Instituições Policiais. As Polícias se completam entre si com as suas funções definidas em Lei para compor a Segurança Pública.
Necessário se faz uma breve consideração para não se confundir o Inquérito Policial comum que é atribuição exclusiva da Polícia Judiciária, com o Inquérito Policial militar. Conforme bem explicita o colega Delegado de Polícia do Mato Grosso do Sul, ROBERTO GURGEL DE OLIVEIRA FILHO, num dos seus artigos recentemente publicado: “No caso dos inquéritos policiais militares, estes servem para a apuração de crimes militares e possuem justiça própria para isso, inclusive, com previsão constitucional. Porém, mais uma vez nos deparamos com penas de natureza administrativas. Isto significa dizer que se trata de uma justiça de natureza administrativa, até porque, na hipótese do militar cometer um crime comum será julgado pela justiça comum, federal ou estadual, conforme o crime. Assim, também não há de se confundir o poder de investigação da Polícia Judiciária com o poder investigatório exercido em âmbito de inquérito policial militar.”
É importante registrar que as funções da Polícia Judiciária, em conformidade com a previsão do artigo 144 da Carta Magna, são da atribuição exclusiva da Polícia Civil, dirigida por Delegado de Policia de Carreira, enquanto que a Polícia Militar deve desempenhar as atribuições do policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública.
É de se frisar que bem recente o Ministério do Trabalho também definiu a função do Delegado de Polícia. A Classificação Brasileira de Ocupação - CBO - define como responsabilidade do Delegado de Policia a exclusividade das atividades de Polícia Judiciária, dirigir e coordenar as atividades de repressão às infrações penais, restabelecer a ordem e segurança individual e coletiva, as atividades de interesse de segurança pública, expedir documentos públicos e administrar recursos humanos e materiais
Existem também movimentações no Legislativo e no Judiciário que pretendem passar a Investigação Policial para o Ministério Público, vez que uma pequena parte de Juristas entende que o Inquérito Policial não passa de uma simples peça informativa.
O Advogado militante no Distrito Federal, EDUARDO MAHON, num dos seus artigos relacionados a Policia Civil, bem alerta: “Está em curso um sutil movimento orquestrado de esvaziamento da Polícia. O objetivo final é submetê-la, por completo, ao Ministério Público. Como fazer isso, se estão elencadas as prerrogativas das Autoridades policiais? É simples. Além de minar a credibilidade da classe, divulgando amplamente imagens negativas, intervindo brutalmente nas questões internas, sucateando a máquina policial investigativa, retroalimentando a frustração social com relação às atividades inerentes dos Delegados e seus agentes, as atribuições constitucionais são maliciosamente (re) interpretadas como “concorrentes” e não exclusivas. (...) O centro gravitacional quer se tornar um buraco negro e a Polícia Civil, depois de enfraquecida, será apenas um satélite a ser engolido.”
Para o criminalista TALES CASTELO BRANCO, “o MP exerce o controle externo da polícia e pode solicitar diligências, mas quando faz investigações usurpa atribuição exclusiva da Policia prevista na Constituição.”
Relacionado a esta questão é de bom alvitre especificar a opinião do grande Jurista CELIO JACINTO DOS SANTOS, quando entende que: “O Inquérito Policial não é mera peça informativa, como quer parcela minoritária da doutrina e da jurisprudência, mas, um instrumento de defesa da cidadania”.
Ainda nesse sentido o Mestre em Direito e Juiz Federal, NEWTON JOSE FALCÃO, dá uma verdadeira aula para aqueles que advogam a pequenez do Inquérito Policial, quando discorre num dos seus artigos: “Enganam-se aqueles que sustentam que o Inquérito policial é um procedimento inútil e descartável, que não passa de um caderno informativo, sem força probatória. Cabe ao Delegado de Polícia, na condução do inquérito policial, colher os elementos de prova da autoria e da materialidade, reunindo subsídios para que o Ministério Público possa formar sua opinião e oferecer denúncia. A condenação do acusado vai depender da qualidade da peça investigatória. O inquérito é o instrumento que possibilita ao Estado-Juiz o exercício do “jus puniendi” (...) A prova colhida na fase investigatória pode e deve sustentar um decreto condenatório, se encontrar respaldo nos elementos dos autos do processo” (...)
Ressalte-se que tramita na Câmara Federal o Projeto de Lei 4306/08 que torna o inquérito policial a base obrigatória para a denúncia ou queixa feita pelo Ministério Público, diferente de hoje em que o Promotor não é abrigado a considerar as informações daquele instrumento para formar a sua convicção de que deve denunciar determinado ato.
Por outro lado a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, em julgamento dias atrás, reconheceu por unanimidade que existe a previsão constitucional de que o Ministério Público tem poder investigatório ao analisar o Habeas Corpus 91661 referente a uma ação penal impetrada por crime de Denunciação Caluniosa. Entretanto, a Ministra Ellen Gracie, relatora daquele Remédio Jurídico ponderou que: “Essa conclusão não significa retirar da polícia judiciária as atribuições previstas constitucionalmente.”
Também, no mesmo sentido dessa pretensão do Ministério Público, está sendo analisado pelo Supremo Tribunal Federal o Habeas Corpus 84.548 referente a um crime de Homicídio. Dois Ministros já votaram quando a matéria foi levada a julgamento. O relator, Marco Aurélio, entendeu que só a Polícia pode presidir Inquérito Policial, enquanto que o Ministro Sepúlveda Pertence (já aposentado) reconheceu o poder do Ministério Público para fazer investigações. O Ministro Cezar Peluso pediu vistas dos autos em 11/06/2007 e até a presente data não retornou com o seu parecer para a continuidade e decisão final, contudo, com o primeiro julgado acima citado já se fez Jurisprudência e a tendência é se repetir aquele entendimento.
Enquanto isso, segundo o colega Delegado de Polícia do Estado de São Paulo, JOEL DE LUNA BOZOLO, há um pequeno grupo de doutrinadores propondo a extinção do Inquérito Policial. “Argumentam que deveria ser criado em substituição, um Juízo de Instrução. Haveria economia processual, rapidez na aplicação da Lei e as provas seriam produzidas uma vez, perante o Juízo. A Autoridade Policial limitar-se-ia a investigar criminosos, averiguar a materialidade dos crimes e arrolar e indicar testemunhas.”
Entretanto, em contrapartida, o renomado Advogado LUIZ FLAVIO BORGES D’URSO num dos seus artigos argumenta: (...) advogar a eliminação do procedimento administrativo policial, penso ser um desserviço à Nação, pois por meio do Inquérito é que se dá o suporte às provas produzidas e mais, por ele se revela uma cerimônia pré-processual, que tenho como indispensável à credibilidade da Justiça (...)
A autonomia da Polícia Judiciária também é tema de discussão. A PEC 293/08 que altera o art. 144 da Constituição Federal, atribuindo independência funcional à nossa Instituição Policial teve o seu parecer apresentado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal sendo acatada a sua admissibilidade em outubro passado. Trata-se de um sonho antigo da classe dos Delegados. A Autoridade Policial no exercício das suas funções por muitas vezes se vê pressionado e com essa independência aprovada, por certo, poderia exercitar a sua importante atividade profissional, sem qualquer receio de perseguições.
Nesse sentido entende a favor do Delegado de Policia o Professor e Mestre em Direito Penal, LUIZ FLAVIO GOMES, ao discorrer num dos seus artigos: “A preocupação com a ausência da autonomia da Polícia Judiciária é justificável em função da crescente importância que a investigação criminal vem assumindo em nossa ordem jurídica, seja por conta de uma necessária mudança de postura a seu respeito, para considerá-la como garantia do cidadão contra imputações levianas ou açodadas em Juízo, seja pelo papel mais ativo que tem sido desempenhado nos últimos tempos pelos órgãos policiais”.
Mudando para outro pólo, existe a problemática do Delegado de Policia estar ocupando função diversa das suas atribuições previstas em Lei. Dentre os seus atributos descritos na Carta Magna, por certo não aponta que ele está em concordância com a Lei de Execução Penal no tocante a ter obrigação de ser diretor de cadeia, diretor de presídio ou coisa equivalente, assim como seus auxiliares, de igual modo, não são carcereiros. Tais atributos pertence a Secretaria da Justiça, não a Secretaria da Segurança Pública, entretanto, na prática não é isso que vemos. Na verdade em Sergipe, como de resto na maioria dos outros Estados do País, se vê - como por falta de opção - em virtude dos presídios estarem superlotados, as Delegacias de Policia também com essa obrigação desvirtuada. As Delegacias de Polícias também estão abarrotadas de presos processados e até condenados sob a guarda da Polícia Civil, desmistificando assim a sua função investigativa, a sua função de Polícia Judiciária.
Nesse sentido da superpopulação carcerária que transferiram responsabilidade para a Polícia Civil, é de se acolher o que disse o colega Delegado MARCELO HERCOS LYRIO, no seu artigo pertinente ao tema: “Haverá um dia em que Delegacia de Polícia deixará de ser Cadeia Pública e Delegado de Polícia deixará de ser Diretor de Estabelecimento Prisional sem remuneração extra. Neste dia, a polícia civil poderá exercer suas atividades com mais dignidade e eficiência. No fim quem ganhará será a população.”
Quanto ao apelo do colega acima citado, há a esperança de concretização do desejo geral da nossa Instituição policial, através do Projeto de Lei 4051/08, da Deputada Marina Maggessi, que proíbe a utilização das dependências da Polícia Civil para custódia de presos, mesmo temporariamente. A Proposta, de acordo com a Agência Câmara, será analisada em caráter conclusivo pelas Comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado e da Constituição e Justiça.
A brilhante Proposta da Deputada mostra sensibilidade ao detectar um dos problemas mais grave enfrentado pela Polícia civil que traduz malefícios para todos. Na opinião da autora, observa-se dentre outros motivos: “Esse desvio funcional reduz a eficiência da Polícia no cumprimento de suas funções, pois obriga os agentes a agir como carcereiros, trabalho para o qual não foram treinados e não dispõem de tempo”.
Partindo do princípio de que o Delegado de Policia também atende ao público e intercede em contendas para desafogar o Judiciário ou para resolver problemas emergentes na sua Unidade Policial, a recíproca é verdadeira de que no seu cotidiano ele investiga, comanda, aconselha, dirime conflitos, evita o crime, faz a paz, regula as relações sociais, cumpre as suas atribuições definidas em Lei e também exerce o cargo “alienígena” de Diretor de Cadeia.
Adentrando na questão do Projeto de Emenda Constitucional 549/06 há de se destacar o entendimento da colega Delegada de Polícia de Santa Catarina, SONÊA NEVES, ao discorrer sobre o tema: “A PEC 549/2006 está sendo alvo de movimentos de entidades que buscam o impedimento de sua aprovação, sem motivo que comprove o seu prejuízo quando aprovada. Nunca na história do Congresso existiu movimentação pela não votação de um Projeto que não colide com interesses de quem os faz e que tais movimentações são inadmissíveis (...) Esses movimentos desenfreados e desproposital incitam a desunião na Polícia Civil, jogando Agentes Policiais contra os Delegados e a maior desagregação das Polícias num modo geral.”
Ainda, segundo o entendimento, a PEC 549 beneficia TODA A POLÍCIA JUDICIÁRIA, dado ao fato dela “admitir o Provimento Derivado, que possibilitará aos Policiais Civis formados em Direito e com tempo de carreira tenham uma % de vagas destinadas a eles nos concursos para Delegado de Polícia.”
A discussão é ampla em diversos organismos do País para votação e aprovação da PEC 549, dentre as quais há de se destacar também a posição do Magistrado LUIZ GUILHERME MARQUES do Estado de Minas Gerais quando disse num dos seus artigos relacionados à Polícia Judiciária: (...) ”Não basta simplesmente remunerar melhor aqueles valorosos operadores do Direito. É preciso urgentemente acabar-se com as desagradáveis ingerências políticas. Para tanto, as garantias desses profissionais têm de ser equiparadas às dos membros do Ministério Público. A Justiça, como um todo, também ganhará muito com essas mudanças. Tomara que haja empenho dos Nobres Congressistas para valorizar aqueles homens e mulheres que correm até risco de vida no trabalho de desvendar crimes e colher provas contra marginais perigosos, principalmente os de colarinho branco” (...)
É com tamanha insensatez que os dirigentes da FENEME - Federação dos Oficiais da PM - procuram prejudicar o trâmite da PEC 549, como se a não aprovação de tal Projeto os beneficiasse de alguma forma. É com tamanha incompreensão que se vê os próprios Policiais Civis e Federais aderirem a essa incoerência dos Oficiais da Policia Militar, vez que ninguém apresenta uma oposição lógica de beneficio às próprias razões.
É comum vermos as diversas classes institucionais de todas as áreas lutarem por suas melhorias, entretanto, em contrapartida, é incomum se lutar pela não melhoria de determinada classe, especificamente quando tal intento não beneficia em nada a classe oponente. Razão pela qual, necessário se faz que se repensem tais posições descabidas.
No meu entender ao invés das Instituições e Classes Policiais estarem perdendo tempo precioso com uma luta desnecessária e irracional contra a aprovação da Carreira Jurídica do Delegado de Polícia, deveriam se unir e se fortalecer para que fosse criado através de uma Emenda Constitucional um piso nacional para todos, valorizando assim a Polícia em geral. Tal piso seria definido em Lei para cada Instituição Policial nos seus diversos escalonamentos, sendo que o Governo Federal entraria com o complemento dos recursos necessários ao seu pagamento no caso dos Estados que se mostrassem incapazes de fazê-los. Aí sim, se acabaria de vez com as brigas e picuinhas existente entre todas as classes Policiais e todos teriam um salário digno para poderem bem representar os preceitos Constitucionais inerentes com a conseqüente melhoria da Segurança Publica.
(*Delegado de Polícia. Pós-Graduado em Gestão Estratégica de Segurança Publica).
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